Os primórdios do Estado egípcio: contextualização histórica, geográfica e social.

A história do Egito propriamente dito tem como marco inicial a consolidação dos reinos do Alto e do Baixo Egitos e a ascensão ao poder da I Dinastia de faraós, por volta de 3000 a.C., com capital em Mênfis.

Nos milênios que antecederam a formação do assim chamado “Reino Unido”, os grupos de caçadores-coletores que exploravam a fartura do Nilo — peixes e aves abundantes, antílopes que frequentavam os baixios e a cevada silvestre que se espalhava pela rica camada aluvial deixada pela cheia anual do rio — mantiveram seu estilo de vida sem maiores alterações. A partir de cerca de 5200 a.C., porém (aproximadamente 2 mil anos depois de os habitantes da Mesopotâmia começarem a cultivar a terra), uma lenta onda migratória foi modificando a face do vale do Nilo. Parte dos novos colonos, oriundos do Crescente Fértil, trouxeram consigo gado e variedades domésticas de trigo e cevada. Sua contribuição, incrementada pela gradual intensificação do comércio com a Mesopotâmia, levou à incorporação também dos veículos com rodas, das técnicas de irrigação (que, como na Mesopotâmia, seria responsável pela geração de um excedente agrícola e do espírito de disciplina coletiva), construção com tijolos e fabricação de barcos, e sobretudo da escrita, que irromperia bruscamente, sem antecedentes, nos primórdios da I Dinastia.

Quando as águas recuavam após as cheias anuais, que chegavam ao Vale do Nilo — uma fenda de 800 km que corta o Saara da Primeira Catarata aos pântanos do Delta do rio, conhecida como Alto Egito — pouco depois do solstício de verão (no hemisfério norte, 21 de junho), tinham início os trabalhos de irrigação e plantio. O sistema criou vínculos comunais ao longo de todo o rio, e com o tempo grupos de aldeias rurais foram se organizando em províncias conhecidas como “nomos”, governadas pelos “nomarcas”. Com poucas barreiras geográficas e políticas a superar, os nomos do Alto Egito não tardaram a se unificar sob um mesmo governante, num processo iniciado por volta de 3500 a.C. e encerrado em um ou dois séculos.

Já nas terras alagadas do delta, chamado de Baixo Egito, onde a maioria das aldeias permanecia isolada durante todo o ano, as condições de vida eram mais adversas. A tradição egípcia atribui a um primeiro soberano divinizado, Menés, a unificação do reino e a fundação do Estado — proezas que provavelmente representam realizações de vários governantes entre 3200 e 3000 a.C.. Para celebrar seu triunfo, Menés teria erguido sua capital, Mênfis, numa área protegida das cheias do Nilo e próxima ao ponto onde se origina o delta. Foi na Mênfis “das brancas muralhas” que se celebrou, pela primeira vez, a cerimônia da coroação; lá, por mais de três milênios, os faraós seriam coroados, num ritual cujo ápice seria uma reprodução dos procedimentos inaugurados por Menés. “Não era uma comemoração dos feitos de Menés, mas a renovação da fonte criadora presente no acontecimento original”, salienta Eliade [1, p. 93, grifo do autor]

Mapa do Antigo Egito, com algumas das principais cidades e referências geográficas |


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